quarta-feira, 28 de março de 2007

Depois do palco, banda encara altar


Monobloco faz trilha sonora de casamento depois de colocar o povo para sambar

Alexandre Fóes fez discotecagem e já tocou muito rock’n roll. Passou pela faculdade de música e hoje toca de tudo, mas em ritmo de samba. Junto com os demais 27 integrantes do Monobloco, Fóes está reinventando o jeito de se olhar para o samba. O Monobloco começou em 2000, com os membros da banda Pedro Luís e a Parede, ou simplesmente “A Parede”, como é chamada por seus integrantes. Em 1999, eles organizaram uma semana de oficinas. Na de percussão, logo levaram os alunos para batucarem pelas ruas. E de lá não saíram.

O Monobloco virou bloco de rua durante o carnaval carioca, levando mais de 60 mil pessoas para a orla de Ipanema, e, hoje, oferece uma oficina de percussão durante o ano inteiro. Além disso, gerou o Monobloco Show, que passou pela primeira vez por Curitiba na sexta-feira [23/03/07], no palco do Calamengau – onde já se apresentaram três vezes com a formação da Parede.

No palco, de um momento para outro, a batida muda. “É como uma partitura; tem que dominar o instrumento. Podemos virar a página que quisermos, mas temos que fazer o público continuar dançando”, brinca o percussionista C.A Ferrari. Os instrumentos são os tradicionais da bateria de uma escola de samba, mas outros também são bem vindos. “O gostoso do trabalho deles é que passeia por todas as vertentes do samba, trazendo coisas novas”, comenta o dono do Calamengau e fã assumido, Maérlio Fernandes Barbosa, o Ceará - que logo avisa: “Para subir no meu palco tem que ser melhor que eu”. No espaço, por onde já passaram Tom Zé, Elza Soares e Hermeto Pascoal, o Monobloco não decepcionou.

O grupo tem admiradores nos quatro cantos. Alguns escoceses estavam passeando pela Lapa, no Rio. Viram a banda passar e ficaram encantados. A batida do Monobloco influenciou os novos trabalhos do grupo, que convidou os brasileiros para darem uma oficina na Escócia. Em julho, a trupe passará por Reino Unido e Dinamarca.

A influência já chegou até a Universidade da Califórnia, onde um grupo gravou, na batida particular do Monobloco, A cabeleira do Zezé, tradicional marchinha, e disponibilizou no YouTube. Esta é outra faceta da turma carioca: trazer uma nova musicalidade para canções consagradas. Em seu último CD, regravaram Imunização Racional (que beleza), de Tim Maia, na voz de Sérgio Loroza, mais conhecido por seu trabalho como ator – atualmente representa o Figueirinha, no seriado A diarista.

Constantemente, o grupo toca com diferentes parceiros. Fernanda Abreu, Herbert Vianna e Beth Carvalho já estiveram com eles. Num ensaio, eles foram surpreendidos com a presença do guitarrista Stanley Jordan: “O assessor dele nos ligou e disse: vocês topam tocar com ele? - topamos e ele apareceu com a sua guitarra”, lembra o maestro do grupo, Celso Alvim. Pergunto ao maestro sobre alguma influência em especial. Sem hesitar, ele responde: “O Mestre Odilon Costa [da bateria da Grande Rio] foi a nossa grande influência na parte técnica. Nos levou para assistir aos ensaios e nos ensinou tudo sobre a bateria de uma escola de samba”.

O contato abriu outra porta. Em 2001, alguns integrantes do grupo foram convidados para desfilar com a Grande Rio no carnaval carioca. Será que existe a possibilidade de o Monobloco voltar para Curitiba para desfilar pelas ruas? O percussionista Sidon Silva, num lampejo, lembra: “Em 1991 tínhamos um grupo chamado Banda Ligeira e estávamos dando uma oficina no centro cultural do Rebouças. Já no primeiro dia, saímos com os alunos pelas ruas. Passamos pelo Passeio Público, Rua XV e outros pontos”. Desta vez, a banda veio a cidade para tocar num casamento no último sábado. Os dezoito integrantes presentes aproveitaram a passagem por aqui e tocaram na sexta-feira, por quase três horas, de Roberto Carlos a Jorge Benjor; em ritmo de samba, é claro.

FOTOS: Thiago Guimarães

1ª - A "Parede": Mário Moura, Sidon Silva, C.A Ferrari e o maestro Celso Alvim.

2ª - O dono do Calamengau e fã assumido, Maérlio Fernandes Barbosa, o Ceará, logo avisa: “Para subir no meu palco tem que ser melhor que eu”.

* Matéria originalmente publicada no Jornal do Estado do dia 26/03/2007.

sábado, 24 de março de 2007

É tudo uma grande farsa


Felipe Hirsch fala de Thom Pain – Lady Grey e de nova montagem sobre Dalton Trevisan

Hoje à noite [23/03/07], no Teatro da Reitoria, acontece a última apresentação de Thom Pain - Lady Grey na Mostra Oficial do Festival de Teatro. São dois monólogos, que, juntos, têm mais de duas horas de duração. “É um espetáculo muito difícil e árido para o público. Será uma decepção imensa para quem comprou o ingresso achando que vai se divertir”. A sugestão é do próprio diretor da Sutil Cia. de Teatro, Felipe Hirsch. A peça é baseada em dois textos do dramaturgo norte-americano Will Eno, considerado por Edward Albee (autor de Quem tem medo de Virginia Woolf) o artista mais interessante em atividade. Em 2002, Hirsch foi a Londres e conheceu Eno. Nasceu uma amizade e uma primeira parceria: a peça Temporada da Gripe, que passou pela mostra principal do Festival de Teatro de 2004. Eno veio ao Brasil para assistir à montagem e gostou bastante. Ele passava por um momento conturbado: estava se separando da esposa. Voltou aos EUA e escreveu os monólogos, agora adaptados pela Sutil, companhia que começou em 1993 em Curitiba.

“É um texto muito racional, mas que gera muita emoção. São dois atos: o primeiro, a voz do homem; o segundo, a da mulher [Lady Grey, em referência à ex-esposa, inglesa]. Um texto onde aquelas pessoas tentam traduzir com palavras a sensação emocional daquela fase da vida delas”, comenta o diretor. Quem espera pelas extensas referências à cultura pop de A vida é cheia de som e fúria, outra peça da companhia, pode sair desapontado. A maior coincidência entre as duas peças é a presença do ótimo Guilherme Weber como protagonista. Nos setenta minutos de texto interpretados por ele, o espectador é apresentado a uma reflexão que parte da infância de Thom Pain. Nos cinqüenta minutos de Lady Grey, Fernanda Farah traz uma personagem buscando preencher os vazios de um recente abandono. O público tem gostado? O diretor responde. “Tem, mas não conseguem dizer o porquê. É tudo pelo social: é importante dizer que viu e gostou de um espetáculo da Sutil. É tudo uma grande farsa”, afirma.


Um Dalton pouco sutil
A última peça produzida na cidade pela Sutil Cia. de Teatro foi em 2000. Desde então, o grupo formado por artistas renomados como o ator Guilherme Weber e a cenógrafa Daniela Thomas - também parceira costumeira de Walter Salles - tem produzido seus espetáculos em São Paulo. O retorno da produção a Curitiba vem com a produção do espetáculo Educação Sentimental do Vampiro. “Insistimos em ensaiar em Curitiba, porque conseguimos ficar mais isolados”, fala Felipe Hirsch, em entrevista realizada em uma das três salas dedicadas ao ensaio. A trupe, que se prepara para a estréia da peça baseada em textos de Dalton Trevisan, no dia 9 de abril, em São Paulo, tem seu refúgio num hotel no Centro Cívico. Três espaços para conferências foram adaptados para a companhia.

A cada produção, a equipe envolve diretamente sessenta pessoas. No elenco, desta vez, são três atores curitibanos e quatro de outros estados. Para Felipe Hirsch, é um espetáculo que causa angústia, “mas se você me perguntar por que eu quero causar angústia nas pessoas, eu não sei”. Hirsch ainda fala das dificuldades de adaptar um escritor tão próximo: “Quando você faz um Tchecov, você imagina uma Rússia; quando você faz um Dalton, você sabe quem são essas pessoas. É muito mais difícil lidar com essas pessoas sabendo quem elas são, do que imaginar um russo e um inverno na Rússia”. Além disso, o diretor sente estar passando por uma situação nova: “É constrangedor estar diante de uma coisa que é tão domínio público. Pela primeira vez, tenho a sensação de exposição total”. Em São Paulo, a peça ficará em cartaz por sete meses. Quem sabe, em 2008, teremos a oportunidade de ver a peça sobre Dalton em Curitiba.

FOTOS:

1ª - O diretor da Sutil Cia. de Teatro, Felipe Hirsch (Rafael Urban)

2ª - Guilherme Weber, o Thom Pain (Divulgação)

3ª - Fernanda Farah, a Lady Grey (Divulgação - Carol Sachs)


* Matéria originalmente publicada no Jornal do Estado do dia 23/03/2007.