sábado, 7 de abril de 2007

Nome que pesa


Hermila Guedes, a Suely que levou o cinema brasileiro aos céus, e as dificuldades do sucesso*

“Meu Deus, o que é isso? Por que isso?”, Hermila Guedes pergunta a si, tentando entender o próprio sucesso. Se já pensou em desistir da carreira? A atriz não hesita: “Várias vezes”, responde. Como a toda pergunta que faço, a jovem metralha a resposta, pára, respira e olha fundo nos meus olhos, como se esperando uma reação, uma próxima pergunta ou o final da entrevista. Hermila tem um aperto de mão forte, não guarda uma grande distância do ouvinte. Mas está cansada. Esperava que sua vinda a Curitiba - esteve em dois espetáculos no FTC: As três viúvas de Arthur, na Mostra Oficial, e Angu de Sangue, sensação no Fringe - fosse divertida. Não foi. Sessões intermináveis de fotografia e entrevista após entrevista. Não veio desavisada: quando Karim Aïnouz a convidou para o papel de O Céu de Suely, a alertou: depois do sucesso de Madame Satã, a protagonista de seu próximo filme seria muito assediada. “O filme é seu, está em suas mãos”, lhe disse o diretor. Ela considera que o trabalho veio como um presente, mas que existe uma Hermila antes e outra depois. “Tem o lado bom e o ruim. Sempre vão estar me cobrando uma Hermila-Suely”. Apesar disso, para ela, Suely é um papel que vale o reconhecimento.

Em dezembro, representou Elis Regina num especial da Rede Globo, “a televisão te ajuda a te espalhar pelo mundo”, diz. Também atuou em Cinema, Aspirinas e Urubus, de Marcelo Gomes. Já contracenou com um copo de leite - no curta homônimo. “O difícil foi beber litros de leite misturados com [iogurte] Danone. Eu odeio leite”. Chegou aos ensaios de Angu de Sangue bastante tímida, dizendo-se sem experiência. Mas, segundo o diretor da peça, Marcondes Lima, Hermila é uma atriz nata, que era muito insegura, tinha medo de cantar e pensava em desistir. Numa das cenas mais fortes do espetáculo, vai ao microfone para cantar um conto - que fala da história do estupro de uma menina - acompanhada da manipulação de um fantoche que representa a criança. Sempre que canta a música, lhe dá vontade de chorar, especialmente quando lembra da sobrinha, recém-nascida.

“Não sou acadêmica, estudiosa, mas preciso ser. Compenso a minha falta de informação com a entrega mesmo”. Marcondes lembra que, apesar de ela não ter feito cursos, tem dentro de si as preposições do Stanislavski e de outros teóricos do teatro. Até agora, Hermila Guedes parece ter feito as melhores escolhas possíveis. No premiado Baixio das Bestas, que estréia em maio, representa uma prostituta. Não tem medo de ficar marcada com estereótipos. O seu grande desafio será conseguir viver com o estigma do seu próprio nome, “esse nome que já está pesando quando eu ouço”.

FOTOS: Rafael Urban

1ª - A atriz Hermila Guedes depois da apresentação de Angu de Sangue, uma das melhores peças apresentadas no Fringe deste ano.

2ª - Na peça, a atriz solta a voz. Num momento emocionante, conta através de uma canção a história de uma menina que foi estuprada, representada por um fantoche manipulado por uma ator da companhia.

3ª - Hermila Guedes recebe os aplausos da platéia do Festival de Teatro ainda vestindo o figurino de seu último personagem da peça Angu de Sangue.

* Matéria originalmente publicada no Jornal do Estado do dia 06/04/2007.

EXTRA! EXTRA!
Leia também a entrevista feita por Marcelo Salinas:
cineme-se: Entrevista com Hermila Guedes

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